Por Robson Matos

O vestiário cheirava a grama molhada e nervosismo. Davi, 19 anos, era o mais novo da equipe. Naquela tarde, faria sua estreia como goleiro profissional. Enquanto vestia as luvas, o treinador se aproximou com um sorriso curto e um olhar firme.

— Já ouviu isso, garoto? “O goleiro é como um piloto de avião. Não pode falhar.” — disse o técnico, batendo levemente no ombro dele.

Davi assentiu em silêncio, engolindo seco. Sabia exatamente o peso daquela frase.

Lembrou-se de histórias que seu pai contava. Como a de Moacir Barbosa, o goleiro da Seleção Brasileira em 1950, que, aos olhos de milhões, “falhou” no Maracanazo contra o Uruguai. Por décadas, carregou a culpa como se fosse o único responsável. Como se tivesse derrubado um avião com todos a bordo.

Ou da redenção de Taffarel, em 1994, herói dos pênaltis contra a Holanda e a Itália. Ou de Oliver Kahn, que mesmo após uma falha na final da Copa de 2002, levantou-se com dignidade, recebendo o prêmio de melhor jogador do torneio. Como um comandante que assume a turbulência, mas mantém o controle da aeronave.

Davi entrou em campo com essas lembranças rodando como hélices na mente. O jogo foi tenso. Fez boas defesas, mas, no final, falhou em um chute defensável. A bola escapou como sabão entre as mãos. Gol. Derrota. Silêncio. E a queda.

No vestiário, de cabeça baixa, ouviu as primeiras críticas. O som do julgamento era pior que a vaia.

Mas então, o treinador voltou.

— Você sabe por que confio em você, garoto? Porque até o melhor piloto, no primeiro voo solo, treme. Mas não desiste de voar.

E completou:

— Um goleiro não é feito só de defesas. É feito também da coragem de levantar depois da falha. De levantar e dizer: “Próximo voo, eu pouso em pé.”

Na semana seguinte, Davi treinou como nunca. E na partida seguinte, brilhou como poucos. Voou para salvar um chute à queima-roupa, agarrou cruzamentos como quem segura um leme em tempestade. A torcida, antes desconfiada, aplaudiu de pé.

A lição?

Se você é goleiro — ou assume qualquer função onde o erro parece ser um luxo que não se pode ter — lembre-se: até os pilotos mais experientes enfrentam turbulências. Mas nenhum avião sobe sem decolar. E nenhuma carreira se ergue sem quedas.

Falhar não te derruba. O que te derruba é desistir de voar.

Voe, goleiro. O céu é seu.

Em homenagem a Heitor, filho do autor.